Ao fazer a curva do Morro da Viúva, a toda velocidade, Luís Cláudio viu o Abdias do Nascimento, num poste de ônibus. Parou um pouco adiante e chamava, aos berros:
— Abdias! Abdias!
Deu também uma frenética buzinada. O Abdias era um negro de rara e contundente vaidade racial. Parecia ter prazer de enfiar a cor na cara de todo o mundo. Na fronte erguida e ousada, e na máscara astuta e lasciva, havia algo de Imperador Jones. Luís Cláudio conhecia-o de bate-papos nas madrugadas bêbedas. Nas suas cóleras, o Abdias mudava até fisicamente e como que adquiria a larga e maciça caixa torácica de um Paul Robinson. A distância, viu e reconheceu o Luís Cláudio. Aquilo caía-lhe do céu. Corre e, feliz, senta-se ao lado do branco bonito. Arrancam e o Luís Cláudio atira-lhe a notícia: “Estou livre!” Ri, feroz.
— O Itamarati estava sentado na minha alma! O Estado me pagava pra ser cretino! Acabou!
Abdias solta um pouco do riso grosso e racial:
— Vamos comemorar!
Luís Cláudio não podia. Naquele momento, não. Engraçadinha o esperava na Cinelândia. E, na sua euforia, instiga o outro: “Fala, Abdias, fala!” E olhava, de esguelha, o companheiro. O que o impressionava no Abdias era o olhar de negro acuado, prestes a ser caçado a pauladas. O vento parecia dar tapas na cara de ambos. Excitados pela velocidade, começaram a falar alto. Abdias encheu a voz:
— O Brasil vive uma fase ginecológica!
Explicou: o desenvolvimento traz um medonho estímulo erótico. Nunca o brasileiro foi tão obsceno. E insistia: “É uma obscenidade histórica!” Fez, ali, uma generalização implacável. As mulheres, dos 12 aos 45, emanam uma ativa voluptuosidade. É um problema de constatação visual: os quadris femininos vibram mais e há um desejo surdo e geral fazendo crispar as nádegas até de meninas. Parecia-lhe nítida e taxativa a relação entre o sexo e a epopéia industrial.
Abdias pergunta:
— Você não acha que o meu raciocínio é batata?
Luís Cláudio exulta:
— Batata! E o que faz o romance brasileiro que não vê isso? A nossa ficção é cega para o cio nacional! Por exemplo: não há, na obra do Guimarães Rosa, uma só curra!
O carro passa pela Mesbla e, felizmente, encontra o sinal aberto. Antes, porém, de dobrar o Odeon, Luís Cláudio pára:
— Abdias, olha. Tem uma dama me esperando, ali adiante. Salta aqui.
O outro pergunta, com a mão no trinco:
— Amando?
Teve um riso total:
— Amor no duro! Amor de folhetim da Vecchi! Olha, Abdias, vai!
Salta:
— Obrigado e...
O rapaz chama:
— Escuta, Abdias! Estando com o Guerreiro Ramos, dá lembranças. Diz a ele que chutei o Cerimonial. E que, na vida, o importante é fracassar. E você também, Abdias: não se esqueça de fracassar.
Acena e parte. Abdias vai a pé. Tem um pouco essa frustração cândida do negro que os brancos ainda não mataram a pauladas. (Com o uniforme exato, de listras douradas, seria o próprio Imperador Jones.) Luís Cláudio segue até o Pathezinho. Engraçadinha está lá. Muito olhada, passa pela frente do carro e vem sentar-se ao lado do rapaz. Está numa angústia radiante:
— Meu bem, vamos sair daqui! Pelo amor de Deus, vamos!
Pelo espelhinho, ele olha se vem algum carro. Engraçadinha cobre a metade do rosto com uma das mãos.
*
Durval baixa a voz:
— Um momentinho, Letícia.
E ela, vibrante, mas contida:
— Durval, olha. Eu estou com um pouquinho de pressa.
O rapaz foi até à última mesa. Inclina-se:
— Seu Hilton, eu precisava sair um instante. Mas não demoro. É pertinho.
O outro examinava uns documentos:
— Não demora.
Apanha o paletó e vai ao encontro de Letícia, que já o esperava na porta. Ela teve a idéia:
— Que tal se a gente fosse, ali, na Cavé?
Caminharam, lentamente, na direção de Uruguaiana. Durval arrisca: “Alguma novidade?” Está com um princípio de angústia. Com uma tristeza muito leve, quase imperceptível, Letícia responde (não consegue sorrir):
— Mais ou menos. É sobre tua mãe. Ela esteve comigo, mas não sabe de nada.
Instintivamente, apanha o braço de Letícia:
— Você está me assustando.
Letícia não responde. (Novamente, sente a febre subir do fundo do ser.) Era hora de movimento na Cavé. Duas senhoras deixam uma mesa dos fundos. Durval precipita-se e toma o lugar. Sentam-se. Letícia começa:
— Vou falar rápido porque... O que é que você toma? Eu quero, deixa eu ver. Qualquer coisa. Traz suco de laranja. Sem gelo. Ou por outra: gelado. Traz gelado.
O garçom afasta-se. Durval escolhera, ao acaso, um sorvete de abacaxi. E, então, Letícia fala (com arrepios intensos e constantes):
— Ainda tenho que passar no tabelião. Mas como eu ia dizendo: vou viajar. Vou viajar e não sei quando volto, nem se volto. Depende. Talvez não volte nunca mais. Olha, Durval: eu quero deixar tudo providenciado, inclusive a defesa de Leleco. Agora presta atenção. Eu trouxe, aqui, um cheque, para depositar, na Prolar, em nome de Engraçadinha. Ela não sabe.
— Em nome de... mamãe?
Param um momento porque o garçom vem servi-los. Letícia não tocará no suco de laranja. Abre a bolsa:
— Toma. Está aqui o cheque.
Durval apanha e, maquinalmente, lê a quantia. Estupefato, relê: “Cinco milhões de cruzeiros!” Letícia contrai a boca para prender um riso nervoso:
— Meu bem, não faça comentários. Olha. Eu deposito na Prolar porque assim, compreende?, Engraçadinha pode tirar imediatamente.
Durval relê ainda: “Cinco milhões, Letícia?” A vontade do rapaz é explodir em soluços, ali em plena Cavé. Letícia quer sorrir:
— Querido, eu não tenho ninguém. Estou só no mundo. E Engraçadinha foi a pessoa que eu... Você é muito novo, Durval, e talvez... Mas olha: haja o que houver, tua mãe é uma santa. E outra coisa. Já estive no tabelião e, aliás, vou passar por lá, daqui a pouco. Vê que horas são, no teu relógio? Ah, sim. Ainda disponho de tempo. Escuta, Durval. Depois você fala. E nem precisa agradecer. Tua mãe é minha herdeira.
— Letícia!
Continuou, cerrando as mãos por debaixo da mesa:
— A qualquer momento, eu posso morrer. Posso, claro. Não sou eterna e basta um atropelamento para que...
Ela falava com o lúcido fervor de quem conhece o próprio destino. Finalmente, antes de se levantar, disse:
— Eu queria te pedir um favorzinho. Essa carta aqui. Você quando chegar em casa, hoje, entrega à Engraçadinha. Assim que chegar você entrega. Diz que. Ou por outra: não diz nada. E, agora, vamos. Eu passo na Prolar para depositar. Escuta: vê se a Prolar te dá uma comissão pelo depósito...
*
Primeiro, Luís Cláudio queria levá-la para uma praia misteriosa, que segundo ele teria dálias selvagens. Depois corrigiu: não eram dálias, mas pitangueiras. Engraçadinha reage: “Nem brinca! Eu tenho hora de chegar!” Insiste: “Lá não vai ninguém. Você pode entrar n’água nuazinha!” E ela:
— Banho de mar, sem molhar os cabelos, ah, não! Prefiro teu apartamento!
O desejo fazia do rosto de ambos uma máscara taciturna e cruel. Só quando já se aproximavam do apartamento é que, bruscamente, disse:
— Me viram contigo.
— Quem?
O carro dobrava uma rua. Engraçadinha chora de ódio:
— Uma miserável, uma bruxa me viu e quer fazer chantagem, a desgraçada! Mas olha! Vamos mudar de assunto! Hoje, eu quero ser feliz e vou ser feliz! Enquanto eu estiver contigo, eu...
Pensa: “É a última vez! Ele não sabe que é a última vez! Querido, é a última vez!” Luís Cláudio com a mão livre a puxa para si: “Você sabe que conta comigo e que...” Interrompe:
— Meu bem. Fala de mim e de ti. Fala de nós. Quando a gente chegar no apartamento, eu queria. Nem sei o que queria. Quero tanta coisa. Você tem outras? Tem, sim. Não fala. Hoje, eu quero esquecer tudo.
E, pouco depois, quando entram no apartamento, Engraçadinha se lança nos seus braços. Beija e é beijada. Pede: “Morde um pouco. Morde. Um pouquinho. Se doer, não faz mal. Mas não marca. Pode marcar.” Hirta de volúpia, diz e repete:
— Oh, como é bom! Como é bom!
Luís Cláudio desprende-se, ofegante:
— Agora quero te ver. Toda. Quero te olhar. Tira tudo.
Ela desabotoa, com uma espécie de cólera. Pensa: “Se Letícia morresse! Se essa miserável morresse.” Luís Cláudio contempla, atônito, aquela nudez erecta e vibrante. Aproxima-se, lentamente: Engraçadinha apanha seu rosto entre as mãos: “As outras têm o corpo mais bonito?” E, súbito, soluça:
— Quero ser amada como se nunca mais...
Luís Cláudio baixa o olhar:
— Como teu seio é lindo! — a voz lhe foge! — Lindo como o seio que nunca foi beijado!
E ela, perdida:
— Esquece tudo. Esquece. Eu quero esquecer tudo. Mas tenho medo de gritar. Se eu gritar tapa minha boca.
Foi agarrada, levada, numa espécie de rapto brutal. Houve um momento em que ela gritou. Luís Cláudio fechou-lhe a boca com um beijo. O grito morreu no fundo do ser.
*
Quando Engraçadinha chegou em casa, Durval já a esperava. Ela estava exausta de prazer, saturada de sonho. O filho estendeu-lhe um envelope fechado. Um pouco febril disse apenas: “De Letícia.” Engraçadinha abre ao mesmo tempo que fala para si mesma: “Essa bruxa!” Começa a ler:
“Engraçadinha: Quem te fala é uma morta. Eu já morri; Quando leres esta carta, estarei entre os mortos. Vai parecer desastre e tu dirás que foi desastre. Ninguém desconfiará de um atropelamento. Darling: só te peço uma coisa: acredita no meu amor. É amor, e não tara. Na hora de morrer, eu não mentiria. É amor, Darling, só amor. Para sempre. Já morri e é amor. I love you, I love you, I love you. Letícia.”
Ao lado, excitadíssimo, o filho está falando em cheque, em herança, em depósito. Engraçadinha não ouve nada. Aproxima-se lentamente da janela. Olha a noite. No alto, uma estrela brilhou mais clara.
— Abdias! Abdias!
Deu também uma frenética buzinada. O Abdias era um negro de rara e contundente vaidade racial. Parecia ter prazer de enfiar a cor na cara de todo o mundo. Na fronte erguida e ousada, e na máscara astuta e lasciva, havia algo de Imperador Jones. Luís Cláudio conhecia-o de bate-papos nas madrugadas bêbedas. Nas suas cóleras, o Abdias mudava até fisicamente e como que adquiria a larga e maciça caixa torácica de um Paul Robinson. A distância, viu e reconheceu o Luís Cláudio. Aquilo caía-lhe do céu. Corre e, feliz, senta-se ao lado do branco bonito. Arrancam e o Luís Cláudio atira-lhe a notícia: “Estou livre!” Ri, feroz.
— O Itamarati estava sentado na minha alma! O Estado me pagava pra ser cretino! Acabou!
Abdias solta um pouco do riso grosso e racial:
— Vamos comemorar!
Luís Cláudio não podia. Naquele momento, não. Engraçadinha o esperava na Cinelândia. E, na sua euforia, instiga o outro: “Fala, Abdias, fala!” E olhava, de esguelha, o companheiro. O que o impressionava no Abdias era o olhar de negro acuado, prestes a ser caçado a pauladas. O vento parecia dar tapas na cara de ambos. Excitados pela velocidade, começaram a falar alto. Abdias encheu a voz:
— O Brasil vive uma fase ginecológica!
Explicou: o desenvolvimento traz um medonho estímulo erótico. Nunca o brasileiro foi tão obsceno. E insistia: “É uma obscenidade histórica!” Fez, ali, uma generalização implacável. As mulheres, dos 12 aos 45, emanam uma ativa voluptuosidade. É um problema de constatação visual: os quadris femininos vibram mais e há um desejo surdo e geral fazendo crispar as nádegas até de meninas. Parecia-lhe nítida e taxativa a relação entre o sexo e a epopéia industrial.
Abdias pergunta:
— Você não acha que o meu raciocínio é batata?
Luís Cláudio exulta:
— Batata! E o que faz o romance brasileiro que não vê isso? A nossa ficção é cega para o cio nacional! Por exemplo: não há, na obra do Guimarães Rosa, uma só curra!
O carro passa pela Mesbla e, felizmente, encontra o sinal aberto. Antes, porém, de dobrar o Odeon, Luís Cláudio pára:
— Abdias, olha. Tem uma dama me esperando, ali adiante. Salta aqui.
O outro pergunta, com a mão no trinco:
— Amando?
Teve um riso total:
— Amor no duro! Amor de folhetim da Vecchi! Olha, Abdias, vai!
Salta:
— Obrigado e...
O rapaz chama:
— Escuta, Abdias! Estando com o Guerreiro Ramos, dá lembranças. Diz a ele que chutei o Cerimonial. E que, na vida, o importante é fracassar. E você também, Abdias: não se esqueça de fracassar.
Acena e parte. Abdias vai a pé. Tem um pouco essa frustração cândida do negro que os brancos ainda não mataram a pauladas. (Com o uniforme exato, de listras douradas, seria o próprio Imperador Jones.) Luís Cláudio segue até o Pathezinho. Engraçadinha está lá. Muito olhada, passa pela frente do carro e vem sentar-se ao lado do rapaz. Está numa angústia radiante:
— Meu bem, vamos sair daqui! Pelo amor de Deus, vamos!
Pelo espelhinho, ele olha se vem algum carro. Engraçadinha cobre a metade do rosto com uma das mãos.
*
Durval baixa a voz:
— Um momentinho, Letícia.
E ela, vibrante, mas contida:
— Durval, olha. Eu estou com um pouquinho de pressa.
O rapaz foi até à última mesa. Inclina-se:
— Seu Hilton, eu precisava sair um instante. Mas não demoro. É pertinho.
O outro examinava uns documentos:
— Não demora.
Apanha o paletó e vai ao encontro de Letícia, que já o esperava na porta. Ela teve a idéia:
— Que tal se a gente fosse, ali, na Cavé?
Caminharam, lentamente, na direção de Uruguaiana. Durval arrisca: “Alguma novidade?” Está com um princípio de angústia. Com uma tristeza muito leve, quase imperceptível, Letícia responde (não consegue sorrir):
— Mais ou menos. É sobre tua mãe. Ela esteve comigo, mas não sabe de nada.
Instintivamente, apanha o braço de Letícia:
— Você está me assustando.
Letícia não responde. (Novamente, sente a febre subir do fundo do ser.) Era hora de movimento na Cavé. Duas senhoras deixam uma mesa dos fundos. Durval precipita-se e toma o lugar. Sentam-se. Letícia começa:
— Vou falar rápido porque... O que é que você toma? Eu quero, deixa eu ver. Qualquer coisa. Traz suco de laranja. Sem gelo. Ou por outra: gelado. Traz gelado.
O garçom afasta-se. Durval escolhera, ao acaso, um sorvete de abacaxi. E, então, Letícia fala (com arrepios intensos e constantes):
— Ainda tenho que passar no tabelião. Mas como eu ia dizendo: vou viajar. Vou viajar e não sei quando volto, nem se volto. Depende. Talvez não volte nunca mais. Olha, Durval: eu quero deixar tudo providenciado, inclusive a defesa de Leleco. Agora presta atenção. Eu trouxe, aqui, um cheque, para depositar, na Prolar, em nome de Engraçadinha. Ela não sabe.
— Em nome de... mamãe?
Param um momento porque o garçom vem servi-los. Letícia não tocará no suco de laranja. Abre a bolsa:
— Toma. Está aqui o cheque.
Durval apanha e, maquinalmente, lê a quantia. Estupefato, relê: “Cinco milhões de cruzeiros!” Letícia contrai a boca para prender um riso nervoso:
— Meu bem, não faça comentários. Olha. Eu deposito na Prolar porque assim, compreende?, Engraçadinha pode tirar imediatamente.
Durval relê ainda: “Cinco milhões, Letícia?” A vontade do rapaz é explodir em soluços, ali em plena Cavé. Letícia quer sorrir:
— Querido, eu não tenho ninguém. Estou só no mundo. E Engraçadinha foi a pessoa que eu... Você é muito novo, Durval, e talvez... Mas olha: haja o que houver, tua mãe é uma santa. E outra coisa. Já estive no tabelião e, aliás, vou passar por lá, daqui a pouco. Vê que horas são, no teu relógio? Ah, sim. Ainda disponho de tempo. Escuta, Durval. Depois você fala. E nem precisa agradecer. Tua mãe é minha herdeira.
— Letícia!
Continuou, cerrando as mãos por debaixo da mesa:
— A qualquer momento, eu posso morrer. Posso, claro. Não sou eterna e basta um atropelamento para que...
Ela falava com o lúcido fervor de quem conhece o próprio destino. Finalmente, antes de se levantar, disse:
— Eu queria te pedir um favorzinho. Essa carta aqui. Você quando chegar em casa, hoje, entrega à Engraçadinha. Assim que chegar você entrega. Diz que. Ou por outra: não diz nada. E, agora, vamos. Eu passo na Prolar para depositar. Escuta: vê se a Prolar te dá uma comissão pelo depósito...
*
Primeiro, Luís Cláudio queria levá-la para uma praia misteriosa, que segundo ele teria dálias selvagens. Depois corrigiu: não eram dálias, mas pitangueiras. Engraçadinha reage: “Nem brinca! Eu tenho hora de chegar!” Insiste: “Lá não vai ninguém. Você pode entrar n’água nuazinha!” E ela:
— Banho de mar, sem molhar os cabelos, ah, não! Prefiro teu apartamento!
O desejo fazia do rosto de ambos uma máscara taciturna e cruel. Só quando já se aproximavam do apartamento é que, bruscamente, disse:
— Me viram contigo.
— Quem?
O carro dobrava uma rua. Engraçadinha chora de ódio:
— Uma miserável, uma bruxa me viu e quer fazer chantagem, a desgraçada! Mas olha! Vamos mudar de assunto! Hoje, eu quero ser feliz e vou ser feliz! Enquanto eu estiver contigo, eu...
Pensa: “É a última vez! Ele não sabe que é a última vez! Querido, é a última vez!” Luís Cláudio com a mão livre a puxa para si: “Você sabe que conta comigo e que...” Interrompe:
— Meu bem. Fala de mim e de ti. Fala de nós. Quando a gente chegar no apartamento, eu queria. Nem sei o que queria. Quero tanta coisa. Você tem outras? Tem, sim. Não fala. Hoje, eu quero esquecer tudo.
E, pouco depois, quando entram no apartamento, Engraçadinha se lança nos seus braços. Beija e é beijada. Pede: “Morde um pouco. Morde. Um pouquinho. Se doer, não faz mal. Mas não marca. Pode marcar.” Hirta de volúpia, diz e repete:
— Oh, como é bom! Como é bom!
Luís Cláudio desprende-se, ofegante:
— Agora quero te ver. Toda. Quero te olhar. Tira tudo.
Ela desabotoa, com uma espécie de cólera. Pensa: “Se Letícia morresse! Se essa miserável morresse.” Luís Cláudio contempla, atônito, aquela nudez erecta e vibrante. Aproxima-se, lentamente: Engraçadinha apanha seu rosto entre as mãos: “As outras têm o corpo mais bonito?” E, súbito, soluça:
— Quero ser amada como se nunca mais...
Luís Cláudio baixa o olhar:
— Como teu seio é lindo! — a voz lhe foge! — Lindo como o seio que nunca foi beijado!
E ela, perdida:
— Esquece tudo. Esquece. Eu quero esquecer tudo. Mas tenho medo de gritar. Se eu gritar tapa minha boca.
Foi agarrada, levada, numa espécie de rapto brutal. Houve um momento em que ela gritou. Luís Cláudio fechou-lhe a boca com um beijo. O grito morreu no fundo do ser.
*
Quando Engraçadinha chegou em casa, Durval já a esperava. Ela estava exausta de prazer, saturada de sonho. O filho estendeu-lhe um envelope fechado. Um pouco febril disse apenas: “De Letícia.” Engraçadinha abre ao mesmo tempo que fala para si mesma: “Essa bruxa!” Começa a ler:
“Engraçadinha: Quem te fala é uma morta. Eu já morri; Quando leres esta carta, estarei entre os mortos. Vai parecer desastre e tu dirás que foi desastre. Ninguém desconfiará de um atropelamento. Darling: só te peço uma coisa: acredita no meu amor. É amor, e não tara. Na hora de morrer, eu não mentiria. É amor, Darling, só amor. Para sempre. Já morri e é amor. I love you, I love you, I love you. Letícia.”
Ao lado, excitadíssimo, o filho está falando em cheque, em herança, em depósito. Engraçadinha não ouve nada. Aproxima-se lentamente da janela. Olha a noite. No alto, uma estrela brilhou mais clara.
4 comentários:
Oi Jana!!!! obrigada pelo carinho!
é,,,,Natal pra mim é comemorado tooodos os dias. O espírito natalino habita 365 dias nas mentes privilegiadas;)
beijo! tenha vc e sua familia, otimas festas e 2010 repleto de novas abençoadas!
Gisele
Que 2010
seja o início de novo tempos
onde se cultive bons sentimentos
e se tenha uma colheita farta de amor,
fraternidade, união e muita paz.
Que o amor de Cristo ilumine nossas vidas
trazendo-nos...
... felicidade,
... prosperidade,
... saúde.
Feliz 2010
Vim agradecer o comentário no meu post do Pout Pourri à Trois e encantei-me!
E estou fazendo uma breve leitura dos outros capítulos, depois lerei com calma!
Parabéns!
Seguindo.
http://o-obvio-utopico.blogspot.com
htto://poutpourri-a-trois.blogspot.com
http://saladalivre.blogspot.com
Está marcada, marcadíssima.
Meus parabéns.
Meus parabéns mesmo.
Estou de cara, muito digno.
abraços.
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